01 novembro 2009


(District 9, EUA, Nova Zelândia, 2009). Mais um filme sobre extraterrestres? Sim. Mais um que se beneficia do se-tem-ET-podemos-tudo? Também. Mas para não dizer que não há esforços, Distrito 9 traz alienígenas em funções humanas, num enrendo com sacadinhas risíveis sobre o subdesenvolvimento. Por risível entenda o que melhor lhe entretém.

30 outubro 2009


(Easy Virtue, Reino Unido, Canadá, 2008). Bons Costumes (clique aqui)

25 outubro 2009


(Up, EUA, 2009). Quase tudo o que se espera da Pixar está em Up - Altas Aventuras. Só faltou surpreender mais.

19 outubro 2009


(The Informant, EUA, 2009). Steven Soderbergh estaria num ritmo de dar inveja se seus quatro últimos lançamentos em apenas dois anos - os Che's, Confissões de uma Garota de Programa e, agora, O Desinformante - realmente fossem dignos de receberem as honras de admiráveis (ainda não vi Confissões, mas o filme não foi lá muito bem recebido). A impressão que O Desinformante passa é por aí. Dá para perceber uma tentativa de dosar tom documental para contar uma história baseada em fatos reais com um estilo mais solto de comédia. Mas esbarrei com Soderbergh com uma energia superficial, que pretende emanar de diálogos e trilhas animadas, mas sem força suficiente para manter ironias. Matt Damon faz bem, mas, para mim, só contribuiu para intensificar essas características. O resultado é nanico e um tanto sem graça. Desempolgante.

08 outubro 2009

Festival do Rio 2009 | Destaques

Abaixo, pílulas sobre os destaques da minha lista de filmes assistidos no Festival do Rio. Entre uma correria aqui e acolá, sessões tapa-buraco e filmes feitos para serem esquecidos, garanto, isto foi muito. Que venha o próximo com mais surpresas.


Mother (Mother, Bong Joon-Ho, Coreia do Sul, 2009). Procura-se a magia imersiva de Bong Joon-Ho neste filme que prioriza uma história que vai e vem em torno da mãe que foge aos preceitos do senso comum de sanidade, em conflito com os sentimentos maternos. |**|

24 City (24 City, Jia Zhang-Ke, China, 2008). As palavras-chaves 'real' e 'ficção' podem aparecer por aqui, mas, como todo clichê, ficam à parte da experiência que 24 City propõe junto aos planos ritmados, semelhante a The World. É simplesmente admirável a forma como Zhang-Ke humaniza os espaços e, a partir disso, extrai fragmentos-histórias dos personagens a fim da construção assistida de uma história coletiva. |****|

As Praias de Agnès (Les Plages d’Agnès, Agnès Varda, França, 2008). Agnès Varda faz seu filme fluir com uma brincadeira, como um abraço, como uma conversa de fim de tarde. Ela lança mão de formas lúdicas e simpáticas ao olhos em jogos de imagens para montar cenas que recriam memórias. Nada mais justo do que apresentar Chris Marker como seu interlocutor ao valer do gênero narrativo que com o dele dialoga. É preciso inteligência para falar de si mesmo, coisa que à Agnès não falta. |****|

Doce Perfume (Tatarak, Andrzej Wajda, Polônia, 2009). Wajda faz uma série de alusões, em uma breve revisitação ao seu próprio passado, e com intervenções metalinguísticas e aparições, põe em prática a intenção de montar duas histórias paralelas com a mesma pessoa/atriz. Doce Perfume se torna peça de interesse quando põe Krystyna Janda a falar de um drama seu, nos moldes bergmanianos, em paralelo com o da personagem.|***|

Bad Lieutenant: Port of Call New Orleans (Bad Lieutenant: Port of Call New Orleans, Werner Herzog, Estados Unidos, 2009). Ética cuspida e escarrada nesta refilmagem de Herzog do filme de Abel Ferrara. Deboche e comédia como resultados, unidos a uma dosezinha de pieguice de Nicolas Cage, em excelente atuação por sinal, em algumas cenas ao lado de Eva Mendes. Crime e sexo sempre rendem audiência, sabemos. Mas já encontro graça no fato de Herzog administrar isso. Imagine o feito. |***|


35 Doses de Rum (35 Rhums, Claire Denis, França, 2008). A sensibilidade ao toque, à fala do outro, ao olhar de quem se esguia é o que, antes de tudo, se destaca no filme de Claire Denis. Com uma narrativa aparentemente dura, 35 Doses de Rum tange o sensível com cenas às vezes frias, às vezes doces, mas na maior parte prosaicas. O estado da arte da simplicidade. |***|

Tokyo! (Tokyo!, Michel Gondry, Leos Carax e Bong Joon-Ho, França, Japão, Coreia, Alemanha, 2008). Se o filme vai por parte, também vou: Michel Gondry aposta num conto sobre autoconhecimento e mostra uma mulher se sentindo mais útil como uma cadeira metamorfose-ambulante. Já Leos Carax esbanja deboche com um ser estranho e agressivo a vagar pelas ruas. No mesmo caminho do ser único e solitário, Bong Joon-Ho utiliza seu bom modo narrativo para fazer de seu fragmento o mais intenso, reflexivo e perspicaz dos três. No conjunto, uma forma de avaliar o estranho. |***|


Aconteceu em Woodstock (Taking Woodstock, Ang Lee, EUA, 2009). Ang Lee percorre uns caminhos um tanto duvidosos nesse filme sobre o famoso festival de música. Com temática introvertida Ang Lee lança um olhar diferenciado sobre a década da libertação, ao mesmo tempo em que dosa a caretice tênue com fórmulas extraviadas. Frases de efeito também não deixam de compor alguns moralismos que o permeiam. |**|

Ricky (Ricky, François Ozon, França, Itália, 2009). Imagino o locutor de filmes da sessão da tarde anunciando Ricky como um filme que vai ser diversão para toda a família. Se quiser procurar alegorias, paralelismos ou maiores explicações para um bebê voador não vai encontrar. E ainda vai se deparar com dramatizações melódicas. Não dá para levar muito a sério, ainda mais depois de se escutar parte do diálogo no filme: "Ele parece um franguinho". |*|

White Material (White Material, Claire Denis, França, 2009). Isabele Huppert vigora a luta de gêneros num filme maduro. O toque de Denis aparece nos rostos.|***|



Viagem aos Pireneus (Le Voyage aux Pyrénées, Jean-Marie e Arnaud Larrieu, 2008). Uma comédia muito bem pincelada com ironia aos bons costumes, digamos assim. Grande parte do que dá certo no filme se deve à Sabine Azéma. A outra, ao bom texto.|***|


A Fita Branca (The White Ribbon, Michel Haneke, 2009). O rigor estético de The White Ribbon acaba aparentando um peso intelectual semelhante ao bergmaniano. A distinção está em fazer da história um retrato local com sensibilidade temporal. |****|


Uma Barragem Contra o Pacífico (Barrage contre le Pacifique, Rithy Panh, Bélgica, Cambodja, França, 2008). Não li o texto de Marguerite Duras, mas por alguns de seus filmes, há um certo incômodo ao ver que Pahn se rende a uma ficção que poderia melhor equilibrar as existências. Barrage Não pode ser definido como um filme sobre a luta de cambodjanos, muito pelo fato de se render a conflitos de mãe e filhos. Contudo, é bonito e, ainda, interessante quando se vê a personagem de Isabelle Huppert transitando entre a tradição moralista, a corrupção pela necessidade e a luta pela liberdade alheia.|***|

Politist, Adjectiv (Politist, Adjectiv, Corneliu Porumboiu, Romênia, 2009). O filme diz a que veio depois de uma boa parte do tempo acompanhar os passos de um policial em investigação: Polistist, Adjectiv, com sutileza se define como um filme de semântica e problematização de conceitos.|****|


Erótica Aventura (L'Aventure, Jean-Claude Brisseau, França, 2009). Não digeri muito bem as investidas de Brisseau neste longa com umas sentenças filosóficas na boca de atores que pegam o ritmo só depois de aventuras eróticas mesmo.|**|

19 setembro 2009

Para falar de tons e ares


(Aquele Querido Mês de Agosto, Miguel Gomes, Portugal, França, 2008).

(O Céu de Lisboa, Wim Wenders, Alemanha, Portugal, 1995)

09 setembro 2009


(A Erva do Rato, Brasil, 2008). Mas quanta tranquilidade: Julio Bressane faz A Erva do Rato fluir com alívio aos ávidos leitores do bruxo de Cosme Velho. É que o receio é típico quando se trata de uma adaptação ou apenas algo que leve obras de um grande escritor, tal qual Machado de Assis, como base para a criação audiovisual. As tensões provindas dos sarcasmos da estória sombria construída pelas ações dos personagens não fogem dos contos machadianos que serviram como base para o filme - A Causa Secreta e O Esqueleto.

O mérito do filme, porém, não se limita a contemplar as características literárias. O ponto de maior destaque é o deslocamento do foco cênico: A Erva do Rato utiliza os personagens humanos (só é uma pena Selton Mello se fechar em seu universo de interpretação) como pretexto para a psicologia do sexo e da obsessão ser representada por um rato. Digo isso com uma certa distância, já que Bressane ressalta o poder da imagem: não é só o animal que conta a história mas, sim, cada fotografia, cada gesto em silêncio. Por isso Walter Carvalho assina a fotografia do filme com um excelente trabalho de ambientação calcada na inocência. Uma inocência sempre questionada, no entanto não julgada, por conta da satisfação de prazeres.

04 setembro 2009

(Two Lovers, EUA, 2008). Quando descubro que interessante é aquilo que lida com conflitos de contrastes sutis e implícitos, e que, tal como em teatro, uma cena bem se sucede após outra a partir dessas tenacidades, eis que na grande tela surge a oportunidade de assistir a Amantes. Personagens bem construídos e sem caricaturas ao bel-prazer do final feliz — exatamente o que James Gray traz como um imperativo da pós-modernidade: um pedantismo não pejorativo por se fazer necessário. Tudo para compor um fino ataque a clichês ao utilizá-los (!) para filmar um conto sobre felicidade: elementos essenciais a favor da contestação contra as formas consagradas para se falar de amor. Por fim, e no fim, um sensacional suspiro interrompido.

27 agosto 2009


(Elle s’appele Sabine, França, 2007). Um documentário tão contrastante que pode ser tocante de diferentes formas. O Nome Dela é Sabine é um filme sobre atenção, cuidado e beleza, por trazer uma personagem tão especial e tão próxima de Sandrine Bonnaire. A diretora compilou imagens filmadas há mais de vinte anos às gravações da irmã em seu estado de autismo atual. São nesses cortes que surge a indagação sobre o que de fato consideramos belo. O olhar penetrante de Sabine arremessa para uma imersão acompanhada de apreciação, com um tempo tal como Baudelaire teoriza sobre amores momentâneos. E logo depois já se está de volta em outra dimensão temporal, mais real e de difícil aceitação. Sandrine nos apresenta Sabine em close, com olhar perdido e face sem expressão. Momentos de seu cotidiano na casa onde moram mais duas pessoas com a mesma doença chegam a ferir com o porquê desmedido pela médica de bom senso: ela não define autismo e descarrega ainda mais subjetividades para falar do que poucos entendem. Somente sentindo o teor da incomunicabilidade para se compreender uma pessoa que Sandrine pretende mostrar como tangível.

22 agosto 2009


(O Contador de Histórias, Brasil, 2009). Uma boa dose de lirismo extraída de uma história baseada em fatos reais. Mas de que realidade estamos falando? Se for externa ao filme, sabemos o quão grave é o sistema da Febem. Agora, que tipo de consistência Luiz Villaça dá à trama de uma pedagoga francesa que vem ao Brasil fazer uma pesquisa sobre essa realidade, e que encontra um menino para objeto de estudo e acaba o adotando? É engraçado. É engraçado? Há persistência em arrancar de nós, espectadores, risadas ou provocar encantamento a partir de moralismos bobos, e fica nisso: uma biografia contada pelos percalços, que chega ao final feliz da superação. Fatos reais, eu sei. Mas falo de modos.

E as atuações... um elenco que representa muito mais do que interpreta. Que tipo de emoção tem uma cena de assalto feita por um ator que externa amadorismo? Direção de atuação em baixa. Cenas que não convencem mesmo. Mas sabe quando o todo se salva por uma parte e os 'com ressalvas' e 'há exceções' acabam sendo as expressões-chaves para se bufar ao fim do filme? Pois então, O Contador de Histórias se enquadra nessa, porque é um filme assistido com brevíssimos aplausos – a interpretação de Maria de Medeiros é a principal responsável por isso -, mas com muitos incômodos.

11 agosto 2009


(Coração Vagabundo, Brasil, 2008). Documentário cosmopolita do provinciano de Santo Amaro, Coração Vagabundo talvez funcione tão bem porque tem a cara de Caetano. Fernando Grostein Andrade o acompanha pelas calçadas e ao mesmo tempo se preocupa com os tipos ao redor: enriquece e eleva o filme ao status de um casamento de contradições com o pano de fundo da coerência entre ideias livres.

É Caetano em sua nova fase de Brasil lá fora, longe dos clichês de acarajé baiano, praia carioca ou avenida paulista, mas perto pelo sotaque, pelo jeito, pelos pensamentos prosaicos nas ruas de Osaka e Nova York. Também pelas andanças em ruas luminosas, pelas cenas urbanas de gente comum. Mas como é Caetano, que não fala (só) para os populares, também integram o elenco pessoas como Michelangelo Antonioni, Pedro Almodóvar e David Byrne. Sempre dá um up documental filmar estrelas além da estrela, não é mesmo? Um tanto emocionante também. Fácil cair no jogo.

Músicas cantadas em inglês, monge budista pronunciando coração vagabondo, silêncio
italiano de Antonioni, espanhol de Curucucu Paloma no filme de Almodóvar, e os ciúmes de Paula Lavigne de Gisele Bündchen são alguns dos fartos exemplos que afiançam o resto do verso da canção que dá nome ao filme: 'quer guardar o mundo em mim'.

07 agosto 2009

(Moscou, Brasil, 2009). Eduardo Coutinho vem instaurando um cinema de obras sequenciais de aprofundamento, sobre um tema que sempre tratou com minucioso cuidado: a união entre real e ficção. Dissociação desses dois? Não! Cada vez fica mais claro que são complementos entre si. É justamente essa associação que provoca as problematizações apresentadas em Jogo de Cena e agora em Moscou. O filme faz, mais do que dialogar com o de 2006, destrinchar resquícios para a abertura do tema: é esse o maior mérito. Com Moscou nem o próprio Coutinho consegue superar Jogo de Cena, só estender.

Na cabeceira da mesa temos Coutinho e o diretor teatral Enrique Diaz em gestos de convite aos atores do Teatro Galpão, para a leitura do texto da peça 'As Três Irmãs', de Tchekov. São cenas enquadradas a bem dos significados, provindos de interpretações em um espaço cênico vazio. As encenações extrapolam os sentidos da peça de Tchekov, deixando 'As Três Irmãs' como história secundária à intenção de Coutinho em questionar a verdade, a partir da sublinha, da conotação metalinguística. As câmeras aparecem, sim, e qual o problema se o jogo está mais do que aberto em um palco?

O filme é causador de um fluxo constante de interrogações que dialogam com a obra-prima que antecede a este que lhes rendeu mais de quatrocentas horas de gravação. Seleção e edição cruciais. E é exatamente por não estar falando somente de formas, mas de significados, que a obra Arca Russa (Alexander Sokurov, 2002) e Moscou se aproximam quanto à experimentação de sobreposição e fluidez de cenas. Daqui a alguns minutos, perpassarão mais alguns experimentais...

Fora isso, a adaptação da peça para um texto que caiba nas bocas e nos tipos dos atores nos traz uma universalidade às avessas, a exemplo de cenas com atores cantando música de Roberto Carlos e hino de Divinópolis.

Mais uma vez temos não só personagens: somos contemplados com rostos, pessoas, histórias, vida. Cada início e fim nos remetem a essa constatação. A saber, o fim de cada cena é um corte desrepeitoso à continuidade, mas carregado de energia para o próximo exercício, para até depois do último minuto de filme, anunciado pela voz impestuosa do diretor. É um filme interessante, sem muito para ser superestimado.

05 agosto 2009


(Loki - Arnaldo Batista, Brasil, 2008). Uma produção do Canal Brasil em projeção digital: Loki - Arnaldo Batista é um típico documentário televisivo com o mote da homenagem ao artista vivo. O que há de novo neste filme que soma-se aos do gênero relaciona-se às escolhas do foco de conteúdo. A história de vida de Arnaldo é intercalada com pinceladas suas em um quadro que serviria de conarrador. Mas a secundarização desta narrativa, jogada para segundo, terceiro plano, é inevitável, uma vez constatada a sua relação com a banda que formou com Rita Lee e Sérgio Dias.

A maior energia de Loki está em Mutantes, está nas expressões e na voz de Rita, mesmo sem ela aparecer em nenhum momento para depoimento. Assim, tentam compensar sua ausência em imagens de arquivo e, por um instante, o documentário é sobre ela (fica o gostinho de quero mais, aliás). Mas não dá para ficar imune ao pensamento de que o primeiro longa de Paulo Henrique Fontenelle tem um objetivo: evitar que se admita que Arnaldo Batista foi esquecido, sendo um cantor que fez parte de um movimento único do Brasil, a Tropicália, sob a alegação da loucura ser estritamente normal.

Mas a carreira solo de Arnaldo Batista dá conta de manter e abarcar tudo o que até hoje representa os Mutantes? Há espaço para expôr as atitudes erráticas de Arnaldo mais para fugir do rótulo de hipocrisia, porque de repente... Não! Não foi esquecido! Grita o filme. O que ele quer nos provar é que Arnaldo é reconhecido, com o ar de desde-sempre-e-sempre-será, como símbolo de irreverência e originalidade. Olhares para a câmera denotam um pouco isso.

Junto
com a necessidade de comparar o rock brasileiro com o dos Beatles, é argumentando com depoimentos que vão do anônimo transeunte norte-americano a Kurt Cobain, que o filme tenta criar uma certeza. No entanto, o que se conclui ao final é que Arnaldo é Mutantes, e Mutantes é Mutantes mesmo com ou sem Arnaldo.

04 agosto 2009

(Okuribito, Japão, 2008). Esperava seriedade, silêncio e lentidão até assistir à mesclagem de Yojiro Takita de dramas pessoais com cenas rasas de comédia em A Partida. O filme tem um toque realista distinto dos clássicos orientais, mas semelhante ao de muitos filmes que trabalham explorando a emoção. O personagem principal perde o emprego na orquestra em que toca violoncelo, procura outro nos classificados do jornal e acaba na atividade de embalsamador de defuntos. Essa é uma das várias tramas em paralelo: tem no mínimo três eixos subjetivos, que se dividem em flash backs e tiradas cômicas. Também acho que há uma perda de foco ao lançar mão de numerosas cenas de corpos sendo embalsamados. Quase um curso ao espectador. Melodioso (falei no violoncelo, não falei?), é repetitivo até nos créditos, quando o curso continua.

16 julho 2009


(Parlez-moi de La Pluie, França, 2008). Depois de assistir o novo filme de Agnès Jaoui, passei a superestimar O Gosto dos Outros (2000), o primeiro longa da diretora, roteirista e atriz de seus próprios filmes. As expectativas são altas por se tratar de uma cineasta talentosa com entrelinhas construídas a partir da configuração de cada personagem. É que Enquanto o Sol Não Vem tem um roteiro menos rico. Faz críticas e reflexões políticas sob uma perspectiva pouco explorada sobre imigração e feminismo, mas não consegue sustentar isso por todo o filme. São cenas pontuais que saltam com o brilho fino da ironia reflexo-cômica, do subentendido — marca de Agnès. O nível de exigência é grande: uma pena essas características não aparecerem a todo instante.

11 julho 2009


(L'Instinct de Mort, França, Canadá, Itália, 2008). Inimigo Público Nº 1 - Instinto de Morte fez parte da Mostra de Panorama do Cinema Francês 2009 junto com outros filmes que, de certo modo, nos mostraram a quantas andam as produções da terra-berço de mestres. Talvez seja demais falar em surpresa com as tendências que este longa de Jean François Richet apresenta. Mas é impensável ficar indiferente às cenas hollywoodianas de L'instinct de Mort, no original. O tom genuíno se esvai logo após as primeiras cenas que parecem nos antecipar um novo Antes que o Diabo Saiba que Você Está Morto (Sidney Lumet, 2008).

Vincent Cassel integra um elenco na medida para o tom blasé da história que vaga pelo conteúdo vez ou outra chacoalhado pelos vibrantes planos gerais e ágeis sincronismos. É com certo incômodo que se vê policiais enfileirados pondo suas armas em riste simultaneamente. Assim, esperar de
L'instinct de Mort uma abordagem não convencional da biografia de Mesrine nos faz nos situarmos neste campo de contemplação: a que veio Richet com sua mistura de estilos? O filme todo tem ares diferentes que perceptivelmente não dialogam entre si com uma única identidade. A parte 2 do díptico talvez abarque melhor as críticas positivas desta ação sobre um bandido ícone da França, só lembrado em difusas comparações com a fama da dupla Bonnie e Clyde.

23 junho 2009


(Welcome, França, 2009). O título Bem-vindo sugere de imediato um tom esperançoso que permeia todo o filme, embora acompanhar as travessias do refugiado curdo na França seja triste; por isso, se tivesse que apontar uma aparência para definir a história, a trataria de 'abatida'. A motivação de Bilal (Firat Ayverdi), o jovem que sofre as restrições da pobreza e da ilegalidade, compõe um conto sobre tentativas, e, assim, temos um roteiro realista nas mãos de Philippe Lioret (Não se Preocupe, Estou Bem!, 2006). Sua direção é sugestiva em alguns momentos, por ações fora de quadro ou saltos de narrativa. Mas, no geral, simplória, funcionando muito bem para valorizar o conteúdo, que precisa desta simplicidade em todos os aspectos de linguagem para não afundar o filme num poço melodramático; porque Bilal é o personagem sofredor, mas bem dosado também pela imaturidade e por seu aparente abobalhamento. Ao desejar reencontrar a mulher que ama tentando atravessar o Canal da Mancha a nado, torna literal o olhar para o horizonte. Expectativas em foco, esperança pelo caminho, decepção por fim: elementos que dão solidez como pano de fundo ao filme que fala de imigração, junto à amizade e cumplicidade do professor de natação, interpretado por Vincent Lindon. Dá para hesitar em afirmar ser um filme 'bonito', mas pelo o que disse neste parágrafo, também dá para ficar no 'ou não'.

07 junho 2009

Pequena nota: 2 em 1

Não cheguei a comentar sobre O Casamento de Rachel [Jonathan Demme, 2008], pois desde que assisti, há uma queda de opinião, outrora positiva. O mesmo vem acontecendo com 3 Macacos [Nuri Bilge Ceylan, 2008]. Ambos, agora vejo, adentram a mesma categoria: a de filmes que se esforçam para se diferenciarem na linguagem e acabam por se desinteressarem pelos significados. A consequência já é conhecida: tédio.

Gosto pessoal à parte, a questão é até que ponto a forma salienta o conteúdo nesses filmes. Elementos gratuitos? Fazer por fazer? Parecem estar confusos com a proposta de cinema autoral defendido por diretores da Nouvelle Vague. A técnica era realmente mais valorizada, a fim de permitir o reconhecimento de elementos formais como característicos de um determinado cineasta. Mas, né, os exemplos para representar essa onda de pensamento da metade do século XX não são ínfimos: Godard, Truffaut...

E o que há de errado com os trabalhos de Ceylan e Demme nesses dois filmes? A supervalorização da técnica como se fosse a responsável pelo filme em si. Demme em O Casamento de Rachel traz uma câmera trêmula e intimista. Tudo bem, se não extrapolasse na vontade de transmitir veracidade, em sequências longas e cenas desnecessárias. Desperdício, muitos supérfluos. A história é legal, mas imagino como teria sido melhor se a direção de Rachel Getting Married, no original, ficasse nas mãos de Ceylan. As vantagens seriam as elipses, maior economia de cenas.

É que em 3 Macacos a economia é o ponto-forte. Mas de tão econômico cai na contradição de abusar dos silêncios. Pode ser por um ritual compensatório: 'não mostro isso para sobrar espaço para mostrar aquilo'. O problema é o aquilo ser bem menos interessante do que o implícito. Dou meu tudo-bem para esse aspecto até o momento em que percebo que faz parte da trama. Porém, começo a perceber que a gratuidade desse modo de contar história esbarra no muro do pedantismo, não? 'Necessário' e 'Interessante' poderiam ser as palavras-luzes para estes que nestes pecam pelo excesso ao tentar fugir dos clichês. Não é um apelo ao convencional, mas sim, um pedido pela melhor dosagem de riscos. Corram-nos, mas pensem no tempo.


(Stella, França, 2008). Stella tem humor, mas peca ao tentar ser de fato engraçado. Tem ironia, mas não convence muito bem quando tenta ser irônico: tudo fica bem melhor quando deixado por conta da naturalidade. E esses são meros detalhes que não desmontam o filme à inferioridade antevista no trailer, esse sim, peça de impressão errônea sobre o trabalho da diretora Sylvie Verheyde. Por se tratar de uma cineasta não muito conhecida, somado à sinopse e ao trailer, o público em potencial de Stella pode ser afugentado pelos elementos que enfatizam ser mais um filme sobre uma menina em conflitos pré-adolescentes.

Vemos esses conflitos pelas narrações em off da personagem principal, mas numa profundidade bastante diferente da superficialidade aparente. Leora Barbara, a atriz que interpreta Stella, é o ponto-chave para toda a leveza que perpassa melancolia, respira nostalgia e não deixa o romantismo de lado, aliado à mise-en-scène da diretora. O peso da expressão 'abuso sexual infantil' é maior que a própria cena que implicita tal ação, por exemplo.

Ganha pontos por ser leve e efêmero, devido aos cortes que impedem o aprofundamento em cenas de maior teor dramático. Isso permite um equilíbrio entre lentidão e agilidade, sem extremos, para lidar com a boa quantidade de pequenos acontecimentos. As músicas compõem uma trilha sonora de tom debochado e condizente com a idade e a época vivida pela menina que detesta a vida dos outros, além da própria: um contraponto, por fim, entre novo e ultrapassado. Sem muita frescura, é filme para gostar de assistir.

02 junho 2009

SEM IMAGEM


(Garapa, Brasil, 2008). Veja, em qualquer um dos cantos da tela, e entenda, as dezenas de moscas por cima das crianças, a mula, os baldes, a terra seca, as plantas murchas, as cercas de arame, as roupas estendidas, os banhos, os panos no chão, as feridas, as ferrugens, a sujeira; e se depare com nudez, inocência, embriaguez, raiva, tristeza, vazio.

Vazio: sensação que nos passam as frases de Josué de Castro e os dados da ONU sobre fome no mundo. José Padilha nos mostra em preto-e-branco, com imagem granulada, coisas que pertenceriam facilmente a cenas de séculos passados. Os cortes pouco interferem na assimilação de que todas aquelas famílias sejam encaradas como uma única a sofrer pelos mesmos males.

A imersão no documentário Garapa ocorre com certo peso pela proximidade da lente, que não pretende passar normalidade. Vez ou outra o silêncio é interrompido por uma conversa entre marido e esposa, mãe e filhos ou enfermeira e paciente. O diretor também se atreve em perguntas para responder o que pessoas alheias àquela realidade gostariam de saber. Garapa tem uma câmera um tanto atenciosa aos detalhes. O foco são três famílias, suficientemente o bastante para entendermos que fazem parte de um todo. O que eles têm a falar estão no mesmo nível de importância do que aparece em torno de seus rostos e corpos nos enquadramentos.

Vejo a maior relevância de documentários em geral no tema. No caso de Garapa temos um que é encarado como previsível para muitos, e por isso o filme em si pode ser menosprezado. Temos a fome destrinchada plano a plano para compor uma linha de raciocínio que termina num ponto de interrogação ou reticências. E está aí a polêmica do que é novidade ou não, do que ainda existe e não deveria existir, da ignorância interna e externa à dura vivência. Para a senhora que saiu da sessão dizendo "isso tudo é a cultura deles", só me resta lamentar por sua frase representar a cultura dela. Quem prefere garapa (água com açúcar) a leite e comida?

29 maio 2009


(Gran Torino, EUA, 2008). Flui entre a evolução constante de humor-ironia-tensão, saltando aos olhos reflexões sobre a América madrasta má de etnias e grupos à margem social. Simplicidade para reforçar tradicionalismos, multiplicidade para tensionar estereótipos. Clint Eastwood vem com Gran Torino para nos lembrar o que é o velho e bom cinema, com roteiro e direção de qualidade, e, ainda, com interpretação enérgica. Sinto-me livre para dizer que Gran faz o meu tipo favorito de 'filme de ação' (referente ao espectador ativo) quem assiste passivamente sai perdendo.

28 maio 2009

child acting

Thiago da Silva
Mutum, Sandra Kogut

(Mutum, Brasil, França, 2007)


Nikbakht Noruz
E Buda Desabou de Vergonha, Hana Malkmalbaf
(Buda as sharm foru rikht, Irã, 2007)



Pernilla Allwin e Bertil Guve
Fanny e Alexander, Ingmar Bergman
(
Fanny och Alexander, Alemanha, França, Suécia,1982)


Enzo Staiola
Ladrões de Bicicleta, Vittorio de Sica

(Ladri di Biciclette, Itália, 1948)


Subir Bannerjee
Canção da Estrada, Satyajit Ray

(Pather Panchali, Índia, 1955)



Omero Antonutti
Pai Patrão, Vittorio e Paolo Taviani
(Padre Padrone, Itália, 1977)


Benóit Ferreux
O Sopro no Coração, Louis Malle
(
Le Souffle Au Coeur, Alemanha, França, Itália, 1971)


Leora Barbara
Stella, Sylvie Verheyde
(Stella, França, 2008)


Jodie Foster
Alice Não Mora Mais Aqui, Martin Scorsese
(Alice doesn't live here anymore, EUA, 1974)

(em constante construção)

23 maio 2009


(Dung Che Sai Duk Redux, Hong Kong, China, 2008). Mesmo diretor do talvez mais pop de sua filmografia, Um Beijo Roubado (2007), e do queridinho de muitos cinéfilos Amor à Flor da Pele (2000), Wong Kar Wai em Cinzas do Passado Redux enche nossos olhos com um cinema quase sensório. A fotografia é rara. Os efeitos imagéticos estão em perfeito equilíbrio. Seus planos valorizam o diagonal, não à toa mediante as declinações dos personagens. As cenas de ação têm um romantismo que só vendo, mesmo. Não é um filme de espadas e arranhões. Muito menos de romances proibidos. Kar Wai soube aqui se apropriar do que a arte cinematográfica tem a lhe oferecer. Esqueça a sinopse. Falar desse jeito faz eu me sentir uma verdadeira esteta, mas vez ou outra é necessário fazer um mãos-ao-alto pela estética: deixando a arte me levar.